sábado, 27 de janeiro de 2018

O POBRE NEOLIBERAL


Nos últimos dias passei a fazer uma análise do meu universo, ou seja, as pessoas que fazem parte do meu convívio familiar e social. Tentei entender, principalmente, os pensamentos antagonistas. Cheguei à infeliz conclusão de que, no fundo, não há pensamento.

As minhas percepções quanto ao comportamento são extensas. Impossível ser curto nessa análise, tentarei também não ser grosso. O trabalho perpetrado pela mídia plutocrática brasileira é digno de um Pulitzer na categoria (des) serviço público, já que o pensamento liberal está completamente implementado em nossa sociedade.
Principalmente a classe média assalariada acolheu sem restrições o conceito neoliberal de meritocracia e se acha totalmente responsável pelo seu destino, quando na verdade não é. A elite conseguiu, com maestria, convencer as pessoas que se o sucesso não é alcançado isso é culpa do estado ou de si próprio. Convenceram as pessoas de que a corrupção governamental é a peste de nosso país, quando na verdade vivemos uma democracia de cartas marcadas, onde o poder do capital elege legisladores que não são mais do que marionetes para o interesse privado. Os grandes empresários brasileiros pagam aos seus políticos vassalos apenas uma comissão sobre os seus ganhos e a massa de manobra, auto-intitulada esclarecida, atribui mais peso ao comissionado que ao patrão.
Claro que a corrupção é um problema. O elegido não deve colocar interesses pessoais ou de outrem à frente do coletivo, mas o capital que rege a democracia elege e destrói. Não há salvação fora da educação social e da conseqüente percepção da consciência de classe.

Somos livres para decidir o que queremos ser. Se atribuímos mais valor aos conceitos de esquerda ou de direita, pouco importa. Valioso é entender que a sociedade é formada por castas, observar em que camada estamos, e a partir daí formar um juízo de valor sobre o que é melhor para a as nossas posições atuais. O que ocorre no Brasil é uma supressão do conhecimento sobre teorias econômicas e da luta de classes.

A classe média assalariada se enxerga pagadora de tributos excessivos e sustentadora de quem está abaixo. Enxerga que dá ao estado muito mais do que recebe. Há nesse extrato da sociedade uma glamorização do empresário e da livre iniciativa, um clamor pela redução dos impostos e da interferência estatal, são contra o recolhimento de FGTS e os impostos sobre os produtos. Estamos falando de pessoas que ganham entre 30 e 60 mil reais anuais. Se você possui essa gama de pensamentos, pode ser considerado um pobre neoliberal. Mais do que isso, a elite brasileira conseguiu, antes de Donald Trump, erguer o seu muro contra pobres, um muro formado de outros pobres de panela na mão. O muro da classe média defende a elite da intervenção do estado, impostos sobre grandes fortunas, impostos sobre grandes heranças, leis trabalhistas, direitos previdenciários, enfim, defende ricos de tudo o que bom para pobres, seus iguais.
Ser liberal é uma opção, já nascer em uma família privilegiada ou necessitada, não. Essa segunda não é uma variável, já que não é opcional ser pobre ou rico, e é mais inteligente que você monte o seu plano de ação a partir de preceitos imutáveis. Não há na nossa educação base o ensino de economia, seja macro ou micro. O pobre neoliberal, que em geral estudou em escola pública ou na particular com muito esforço dos pais, não sabe o que é um modelo econômico, e isso é a supressão de conhecimento.

ONU e, pasmem, o FMI admitem que o modelo liberal é ineficiente contra a má distribuição de renda e não ajuda em nada a evolução dos países em desenvolvimento, como o Brasil. É claro que a política de estado mínimo privilegia apenas os donos dos meios de produção e da geração de capital, aumentando a desigualdade. A aplicação dos preceitos de Milton Friedman nos países ocidentais desde a década de 70 se mostrou ineficaz, aos países em desenvolvimento, no que tange o crescimento sustentado e a distribuição de riqueza.
Sendo assim, se você não detém os meios de produção, ou seja, se você não tem empresa e funcionários, e se você ganha pouco, você depende da atuação do estado para garantir as suas necessidades e direitos. Levantar a bandeira do liberalismo fará de você tão incongruente quanto um peixe que pede por menos água no rio. Se mesmo assim, sabendo que o liberalismo não serve para um país como o Brasil, e entendendo que você é dependente do estado, a sua escolha for por João Dória Jr, é válido, é democrático, é direito e é burro.

Triste mesmo é ver as pessoas assemelhadas a bovinos no pré-abate. Caminhando em um corredor de falácias e propaganda midiática da meritocracia, prontas para terem seus direitos e conquistas surrupiados por pessoas que só pensam em acumular.
Voltando para o meu mundo, a falta de consciência de classe impera nas análises do cenário político atual. Vejo amigos que passaram a adolescência escutando Racionais Mc’s e agora abraçam patos de borracha em frente à FIESP, o analfabetismo funcional da juventude se reflete nas atitudes do homem atual, e a incapacidade de entender a fundo a poesia da periferia transforma um preto tipo A num neguinho.

Vejo amigos que surfaram na onda de prosperidade do governo Lula, que os deu a possibilidade de ganhar hoje mais o que seus pais jamais receberam, mas agora repetem apapagaiados o discurso elitista de estado mínimo, privatizações e PT nunca mais. Boa parte de meus amigos é contra o recolhimento do FGTS, mas possuem apartamento financiado pela Caixa. Conheço pessoas que já fizeram tratamentos caríssimos contra o câncer, ou que conseguiram remédios de alto custo, todos pelo SUS, mas que vomitam ignorância ao falar da carga tributária. Imaginem o pobre neoliberal, sem o SUS, tendo que pagar quimioterapia, quanto do seu salário anual de 50 mil reais, já sem os demonizados impostos, seria utilizado para tal?

Parte da minha família, negra, é contra cotas. Engoliu e replicou o argumento falacioso conservador de que as cotas reforçam o preconceito, justamente como age um um certo vereador da capital . Não percebem que o passado escravo da pele é que formou essa sociedade 53% negra, mas que nas cadeias representa  67%. Antes dos programas governamentais para ingresso de pobres e negros nas universidades, apenas 5,5% dos jovens pretos (18 – 24 anos) freqüentavam a faculdade, isso em 2005. Em 10 anos esse número foi para 12,8%. Comparativamente, 17,8% dos jovens brancos, de mesma faixa etária, eram universitários em 2005, percentual que saltou para 26,5% em 2015. Ao avaliarmos que temos o dobro de pretos nas cadeias e o dobro de brancos nas universidades, podemos concluir que as cotas são correções históricas, mais que justas.

Os pobres neoliberais confundem a cobrança pela eficiência estatal com a destruição do estado. Jogar luz sobre esses aspectos deveria ser obrigação da parcela formadora de opinião da sociedade. O desserviço da imprensa brasileira ao bem estar social é gritante, pois essas grandes empresas particulares de concessão pública reportam à sociedade apenas os fatos pertinentes ao seu interesse econômico.

O desafio é fazer a grande massa entender que empresário não é gerador de empregos, mas sim gerador de lucro, e que se ele tiver a oportunidade de aumentar seus rendimentos em 20% ao custo de trocar todos os seus funcionários por máquinas, ele o fará.

Pobres neoliberais: Estamos em uma luta de classes, você está correndo para o lado errado, será golpeado pelas costas, cairá olhando em meus olhos, ainda defendendo o seu algoz.

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